Presidente da OAB-Pará, Alberto Campos (foto) abre o verbo: o Tribunal de Justiça do Estado ainda mantém 60% dos processos em estado físico, é um dos “mais atrasados” tecnologicamente no País e funciona, em parte, por home office por conta da idade avançada da maioria dos seus integrantes – magistrados na “melhor idade” se recusam a atender advogados por videoconferências e videochamadas. Para ele, o Quinto Constitucional funciona como uma espécie de “equilíbrio de forças”.
- Como a Ordem vê as medidas impostas pelos Tribunais com relação à pandemia e que prejuízos isso tem acarretado ao exercício da advocacia?
- Na verdade, a falta de investimento em tecnologia é o principal empecilho neste momento para os tribunais, pois é necessário contar, na grande maioria, com juízes que o integram funcionando em home office. Essa necessidade se dá pela idade avançada de uma parcela significativa do Judiciário. Há muito tempo a OAB Pará vem cobrando do Judiciário e do trabalho já está bem à frente com relação às digitalizações dos processos. Para se ter ideia, o TJ é um dos mais atrasados na implantação do PJE. Não só nas comarcas do interior, como na capital, há mais de 60% dos processos no estado físico. Agora, com a pandemia, eles abriram os olhos e tiveram que acelerar essa digitalização. Nós temos cobrado muito isso. A dificuldade que há também é da recusa de magistrados em atender a advocacia por videoconferência e videochamadas. O CNJ já recomendou a utilização dessas ferramentas, que a advocacia não pode ficar sem ser atendida pelos juízes e magistrados. Não são todos, mas esta prática tem tornado o exercício da advocacia, na pandemia, realmente bem difícil, por conta da negativa de atendimento à advocacia no meio virtual.
- A informática só trouxe coisas boas para o Judiciário? Hoje o advogado, além de estudar, precisa investir em equipamentos, estudar informática e calhamaços de portarias e provimentos internos para o processo andar. É simples advogar assim?
- Tudo o que é novo, inicialmente, se torna difícil. Assim foi quando tivemos que passar da máquina de datilografia para o computador. Assim foi quando tivemos que sair e nos acostumar com a impressão de peças jurídicas. Assim foi com a implantação do PJE, lá atrás – primeiro pela Justiça do Trabalho. Geralmente, muitas críticas e dificuldades se apresentam para a jovem advocacia, para os advogados que têm mais tempo de exercício da profissão. Isso não quer dizer que seja de todo ruim. Foi uma mudança de paradigma que veio para ficar. Agora, na pandemia, observamos que é ainda mais necessário o avanço no PJE. Nesses investimentos que a advocacia precisa fazer, a OAB tem ajudando muito, porque tem preparado os advogados na questão da qualificação e tem também disponibilizado espaços para aqueles que não têm condições de adquirir a tecnologia, de maneira que possam exercer sua profissão. Nas salas da advocacia, nas salas dos Fóruns, nas Casas da Advocacia que temos pelo interior do Estado e aqui na capital, é papel da instituição fazer com que os jovens advogados e aqueles que ainda não têm condições de investir em tecnologia continuem exercendo sua profissão.
- Por que a OAB não coloca como meta o julgamento, nos tribunais, das grandes operações criminais julgadas em primeira instância?
- A OAB não tem competência para estabelecer meta de julgamento para o Judiciário. O que nós fazemos é cobrar transparência nas informações a respeito nas tramitações dos processos. Fazemos isso tanto no Judiciário estadual quanto no federal. No estadual, por exemplo, estamos pleiteando que seja publicizado no site do TJ a produção de cada magistrado, de cada Vara em todo o Estado, e de cada desembargador, para o jurisdicionado e a sociedade tenham conhecimento de como está a produção de sentenças e o andamento processual. Fazer esse tipo de comparação para pleitear que tenham sido originados de grandes operações me parece inconstitucional e injusto, porque o Judiciário não é feito apenas de processos de grandes operações de combate à corrupção.
- Belém vê crescerem organizações criminosas integradas por policiais civis e militares. Na raiz da violência está o tráfico de drogas, que se disseminou em bairros periféricos com a complacência da Polícia, que conhece as “bocas” e os traficantes e pouco resolve. O que fazer?
- A corrupção ou prevaricação no âmbito das Polícias Civil e Militar tem que ser combatida através do fortalecimento das corregedorias e ouvidorias. A disseminação do crime se combate com implantação de políticas públicas que visem retirar, principalmente, os jovens das ruas, dando a eles educação. O investimento em educação é a principal política pública que pode diminuir a criminalidade em médio prazo.
- O Sr. é contra ou a favor do quinto constitucional, que coloca advogados nas cortes sem concurso?
- Sou completamente a favor. A regra é estabelecida no Artigo 94 da Constituição Federal. E ela tem como a intenção principal fazer com que os tribunais sejam constantemente renovados, com juristas de formações diversas dos magistrados, com experiência profissional, o que permite, em determinado momento, revisão de posições tomadas por órgãos do judiciário colegiados, que, muitas vezes, são ortodoxas, distantes da realidade, pois são, na sua maioria, magistrados de carreira que apenas julgam e não têm o olhar da advocacia, daquele que está de fora do costume de estar avaliando condutas e apreciando casos. Então, democratiza o Judiciário, o olhar da advocacia representada pelo Quinto Constitucional.
- O STF está cumprindo seu papel de órgão de cúpula ou está exagerando no ativismo político?
- O Supremo Tribunal Federal tem com função principal ser o guardião da nossa Constituição Federal. Óbvio que nem todas as decisões são do agrado do jurisdicionado, nem daqueles que estão exercendo o poder político do País. O STF é formado por homens e mulheres de notório saber jurídico que divergem entre si e que, via de regra, podem contrariar interesses, e esses interesses, quando contrariados, geram especulações, reação pública. Mas, temos o maior respeito pelo Supremo Tribunal Federal, e entendemos que sendo ele guardião da nossa Constituição, é uma das instituições fortes da República e que mantém a nossa democracia de pé.
- No Pará, sabe-se de comportamentos incompatíveis com a função envolvendo juízes e promotores públicos. No primeiro caso, contam-se até aposentadorias sem perdas de vencimentos; no outro, remoções de promotores sem maiores danos…
- A chamada aposentadoria compulsória, que é aquela que consiste na maior pena aplicada ao magistrado que cometeu deslizes no exercício de suas funções, prevê a remuneração. Então, na verdade, o nosso combate tem que ser para mudar a legislação. E a OAB-PA e o Conselho Federal têm feito isso de forma insistente junto aos nossos deputados e senadores. Todas as vezes que a OAB toma conhecimento de irregularidades praticadas por magistrados e membros do MP ela aciona as corregedorias de cada órgão, para que tomem as medidas que a legislação prevê, apurando a conduta desses entes públicos.
- No caso de mordomias concedidas ao alto escalão do Judiciário, como aos desembargadores do TRF-1, a OAB nacional tem uma orientação para combatê-las, não só pelo que representam como afronta à sociedade, mas diante do “certo e do errado”?
- Todas as vezes que se toma conhecimento de qualquer tentativa de implementar mordomias que ferem o princípio da moralidade pública, a OAB tem procurado impedir, seja através do CNJ ou através de medidas do Judiciário. Assim foi com essa Resolução 03 do TRF da 1ª Região, que implantou a chamada “Bolsa Banda Larga”’, que prevê o reembolso com gasto em internet nas residências dos magistrados federais, sob o argumento de que vivemos uma pandemia, onde a maioria está trabalhando em home office e precisa de internet em suas residências, como se eles já não a possuíssem hoje em dia, ainda mais com esse nível social que os magistrados possuem. Todos nós, praticamente, possuímos internet em nossas residências. Então, é um absurdo, realmente, assim como também achamos absurdo o auxílio moradia concedido aos magistrados – alguns, inclusive, já estão na capital e continuam recebendo esse tipo de auxílio. Isso, para nós, fere o princípio da moralidade administrativa.