Quando foi publicado pela primeira vez, em 1954, o livro de Darrell Huff foi saudado como o pioneiro em conjugar linguagem simples e ilustrações para tratar de um tema polêmico e controverso: o mau uso da estatística para maquiar dados e abalizar opiniões. Atribui-se a Huff a célebre frase segundo a qual “a estatística é a arte de torturar os números até que eles confessem aquilo que a gente quer ouvir”.
Pesquisas de opinião têm servido, mais do que qualquer outro instrumento, como método de torturar os números e escamotear a verdade.
Nos últimos dez dias, a imprensa paraense tem divulgado pesquisas em profusão, de diferentes institutos, todas elas concordando em encerrar a disputa para o governo no primeiro turno, com a reeleição do governador e Helder Barbalho, do MDB. Mas as coincidências acabam aí. A análise da disputa ao Senado, por exemplo, abre espaço para todo tipo de resultado. A liderança pode estar com Mário Couto (Veritate), com Flexa Ribeiro (Destak) ou com Manoel Pioneiro (Doxa), porque a margem de erro larga autoriza essa imprecisão.
Guindaste eleitoral
Analisando friamente os índices de preferência de cada uma delas, o que parece saltar aos olhos é a persistente paralisia de Beto (da Fetagri) Faro, o candidato do PT. Nem o apoio entusiasmado da máquina do Estado e da Prefeitura de Belém faz o peso pesado subir. O último reforço adicionado ao guindaste eleitoral foi a mudança no comando de comunicação de Beto, que migrou de um quadro interno do partido para o abrigo da mesma equipe de baianos contratados para a campanha de Helder Barbalho.
Sirva-se de acarajé
Não há notícia de que a importação de acarajé tenha produzido entusiasmo no eleitor papa-chibé. Beto patina nos persistentes 10% que exibe desde os levantamentos de abril. A esperança agora reside na vinda de Lula ao Pará, prevista para o dia 2 de setembro. A espera do salvador anima a militância, mas as caravanas de Lula aos Estados não tem influenciado nas disputas domésticas regionais. A impressão que fica é de que a polarização nacional não tem produzido o ‘efeito manada’ que petistas e bolsonaristas previam.
Eleitor de cara virada
O que nenhuma dessas pesquisas no Pará destaca é o altíssimo índice de indiferença do eleitor para essa disputa ao Senado, variando entre 60% a 70% de indecisos, o que transforma os percentuais espontâneos ou estimulados de agora apenas uma cortina de fumaça em relação ao que as urnas revelarão em 3 de outubro.
Jatene entra no jogo?
A novidade nesse quadrante, segundo notícias que circularam por WhatsApp, seria a entrada do ex-governador Simão Jatene (Solidariedade) na disputa da vaga única ao Senado. O burburinho é inevitável por conta do histórico bem sucedido do personagem que venceu todas as eleições que disputou. Mas há dificuldades de Simão Jatene em viabilizar sua candidatura e fazê-la decolar.
Seu partido atual, o pequeno Solidariedade, lançou como candidato ao governo do Estado Major Marcony, desconhecido nos principais colégios eleitorais do Estado e umbilicalmente atrelado à candidatura de Jair Bolsonaro à reeleição, cujo discurso se distancia muito daquele proferido por Jatene ao longo de toda sua carreira política.
Embaraços a vencer
O ex-governador também enfrenta embaraços judiciais. Por unanimidade de votos, o Tribunal Superior Eleitoral manteve, em 21 a 10, a condenação do ex-governador à pena de cassação de mandato e inelegibilidade por abuso do poder político e econômico cometido no âmbito de um programa assistencial com foco na habitação popular, sentença que se estende até o final do ano em curso.
Falta ainda a Jatene apoio partidário, financeiro e político. O PSDB, seu ex-partido, hoje está no palanque da reeleição de Helder. Não há fundo eleitoral suficiente em sua legenda nem deputados estaduais ou federais que até aqui tenham se alinhado a essa iniciativa. Por fim, essa empreitada trás um embaraço moral: ao escolher disputar o Senado, o ex-governador estaria admitindo que não tem forças, meios ou estatura para medir forças com Helder na disputa que ele realmente desejaria fazer.