Cerca de 30% das demissões no Brasil foram voluntárias. Saiba mais sobre o conhecido fenômeno “the great resignation” e como ele traz desafios ao recrutamento e seleção no País.
Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística indicam quase 12 milhões de desempregados no País. Mas, ao mesmo tempo, um terço das demissões têm sido voluntárias – ou seja, gente que “pediu a conta”, de acordo com levantamento da LCA Consultores. Soa contraditório: há desemprego, mas pessoas estão largando seu trabalho. E não se trata de um movimento pontual. É que o Brasil vem experimentando o fenômeno the great resignation, em expansão em boa parte do planeta.
Em tradução livre, o termo significa “grande renúncia”. Na prática, reflete o seguinte: pessoas insatisfeitas não exclusivamente com o trabalho, mas com o modo de vida que levam, decidem pedir a conta. “As pessoas estão encontrando no abrir mão do emprego e tentativa de novas experiências um caminho para buscar satisfação e felicidade”, pontua o executivo Márcio Monson, fundador e CEO da Selecty, empresa curitibana de tecnologia para recrutamento e seleção.
Com 15 anos de contato próximo com a área de RH, Monson avalia que o fenômeno traz desafios às organizações e, em particular, aos setores de recrutamento e seleção. “Os dados, as notícias recentes e a vivência prática mostram que the great resignation, onda verificada nos Estados Unidos, na Europa, na China e na Índia, também já é realidade no Brasil. “As organizações precisam estar preparadas, identificando como tornar as vagas que oferecem não só atraentes do ponto de vista da empregabilidade, mas da satisfação que proporcionam ao profissional.”
Debandada e renúncia
As expressões big quit e great reshuffle – “grande debandada” e “grande renúncia” – são outras formas de nomear a onda. Todas também mostram o que está por trás desse movimento, observa Monspn. “É uma migração de pessoas, de seus trabalhos, muitas vezes bem remunerados e relativamente estáveis, para outros propósitos. Pessoas que consideram que certas atividades trazem menos dinheiro e status, mas geram mais felicidade, por exemplo.”
Trata-se de um comportamento, ainda segundo Monson, bastante acentuado depois da pandemia da Covid-19. A crise fitossanitária forçou a mudança de hábitos, trouxe incertezas e medos, e fomentou reflexões. Nesse caminho, vieram decisões por rupturas, por alterar estilos de vida.
“Recentemente, foi noticiado que, nos Estados Unidos, apenas em dois meses, 8,5 milhões de pessoas pediram demissão, sem ter outra vaga em perspectiva. E, aqui no Brasil, a constatação de que dos 1,8 milhão de desligamentos registrados apenas em um mês, mais de 600 mil – ou 33% – foram voluntários. São dados para serem observados e acompanhados com atenção”, sublinha o executivo.
Efeitos colaterais
Afinal, continua ele, além de engrossar as estatísticas de desemprego, the great resignation
costuma afetar principalmente postos-chaves, vagas que exigem qualificação profissional e outros atributos muitas vezes difíceis de serem encontrados no mercado de trabalho. “Os efeitos internos, nas organizações, e externos – na conjuntura econômica – devem ser mensurados, e seguramente são significativos”, projeta Monson.
Reverter o fenômeno passa por combater culturas tóxicas nas empresas, excesso de pressão, insegurança e falta de reconhecimento profissional. Costumam ser razões como essas – e menos aquelas ligadas ao salário, por exemplo – que motivam as “renúncias”, considera. Ou seja, motivações de ordem psicológica e comportamental, acima daquelas ligadas a fatores materiais. “As organizações, de um modo geral, e os profissionais de recrutamento e seleção, em particular, precisam estar atentos a isso.”