Por Olavo Dutra | Colaboradores
Só para lembrar: a coluna advertiu sobre a instabilidade da candidatura Beto Faro ao Senado e a ausência do influente senador Paulo Rocha no cenário político nas eleições de outubro. Agora, a agenda do ex-presidente Lula prevê encontro com Helder Barbalho para exigir posicionamento do governador e palanque no Pará.
Se o “furo”, a informação exclusiva, é o sonho de todo jornalista, a “barriga”, a informação errada, mal apurada, é pesadelo. No jornalismo político, contudo, o pesadelo está sempre muito próximo, porque incontáveis vezes a verdade não se revela não por ser o seu oposto, mas porque se torna volátil, esvaindo-se nas sombras na velocidade com que os acordos a portas fechadas acontecem – ou deixam de acontecer. Somente quando se observa o fato no seu transcorrer e se joga luz sobre ele é possível perceber a verdade por trás do emaranhado de evidências.
A crise atual do PT paraense é exemplo de uma verdade que insiste em se volatilizar se não for levada rapidamente à luz. E temos buscado fazer isso, na medida em que novas informações nos chegam.
Fontes internas do partido têm dado sinais recorrentes de que a candidatura de Beto (da Fetagri) Faro ao Senado não tem tido dias fáceis. A expressão carregada do deputado nas agendas extenuantes que seu principal patrocinador político impõe não se deve apenas aos quilos a mais que exibe, mas, sobretudo ao clima interno, permanentemente conflagrado, que enfrenta em seu partido.
Apenas um concorrente
Não é novidade para ninguém que, diferente da candidatura de Zequinha Marinho, patrocinada pela família Barbalho em 2018, a candidatura do petista não unifica sequer a base aliada do governo, formada por um arco muito amplo. Se é verdade que o ex-presidente da Fetagri é o escolhido da família, também é verdade que ninguém ali combinou isso com os russos. Nos palanques onde se exibe, impávido, sempre atrás do governador como um segurança anônimo, o petista é visto, especialmente pelos deputados federais, como um concorrente a mais.
Explica-se: o ex-presidente da Fetagri não escolheu apenas disputar a vaga ao Senado, mas também manter-se ocupando uma vaga de deputado federal, que vê como sua, e onde pretende agasalhar convenientemente sua mulher, que hoje ocupa uma vaga de deputada estadual, mantendo-se totalmente anônima graças a uma improdutividade parlamentar de fazer inveja.
Não aprendeu a lição
A lição de que, para cada escolha deve haver uma renúncia, não foi atendida na escola política do ex-agricultor, que hoje vive em uma mansão no Condomínio Montenegro Boulevard, um dos metros quadrados mais caros do Pará. Ao querer tudo ao mesmo tempo sem abrir mão de nada, Beto enfrenta obstáculos crescentes. A base aliada do governo dispersou-se em múltiplas candidaturas depois que o governador desmontou, sem alarde, o palanque de Úrsula Vidal, que até abril liderava a corrida pela vaga. Os eleitores que preferiam a jornalista e ex-secretária de Cultura se dispersaram entre indecisos e demais postulantes, mas não migraram majoritariamente para o petista.
Os problemas de Beto (da Fetagri) Faro são de engenharia política. Ele não apenas não tem o apoio da base de Helder. Não tem, sequer, a unanimidade em seu próprio partido e menos ainda o apoio incondicional de Lula, o líder das pesquisas na disputa presidencial e que declarou, em entrevista recente, que “parece que o PT vai lançar a candidatura do companheiro”, demonstrando distância do tema e do personagem.
A natureza do escorpião
Dono do partido no Pará graças ao auxílio luxuoso do senador Paulo Rocha e do ex-deputado Zé Geraldo, Beto não tardou a atropelá-los. Após enfrentar a crise produzida pelo golpe que perpetrou contra Paulo Rocha, tirando dele o direito de disputar a reeleição ao posto que ocupa, logo voltou-se contra Zé Geraldo – que dormiu suplente de Beto para acordar em lugar algum, substituído na chapa pelo lobista Josenir Nascimento, que se filiou ao PT secretamente, na madrugada da véspera do prazo derradeiro.
Também é sabido que as relações do pré-candidato ao senado do PT com o ex-presidente Lula nunca foram senão protocolares. A ligação com Paulo Rocha, ao contrário, é fraterna, ditada pela longevidade histórica, já que ambos foram fundadores do PT, mas também pela identidade de origem, já que ambos vieram do sindicalismo operário e chegaram a dividir um apartamento funcional em Brasília quando o ex-líder dos metalúrgicos do ABC exerceu mandato de deputado constituinte.
Crise instalada em maio
Fontes petistas que acompanham a temperatura interna afiançam que a crise escalou no final de maio, quando MDB, Cidadania e PSDB confirmaram o lançamento da pré-candidatura de Simone Tebet ao planalto. Interlocutor privilegiado pela relação próxima que tem com o ex-presidente e com a maioria dos quadros que integram seu núcleo duro, Paulo Rocha foi chamado ao Instituto Lula, base da coordenação de campanha do ex-presidente, uma semana depois. Indagado sobre como ficaria o apoio do governador Helder Barbalho diante da confirmação da candidatura de Simone Tebet pelo MDB e da declaração pública de Helder de apoio a essa iniciativa, o senador paraense argumentou que era preciso que o PT atuasse como legenda independe no Para e não como filial do partido do governador.
Alhos com bugalhos
Paulo Rocha indicou que faltava a Beto (da Fetagri) Faro, presidente local, a altivez necessária para argumentar com o ex-governador, uma vez que, ao misturar seus interesses pessoais com os interesses da legenda, submeteu o PT aos seus interesses, se tornou dependente das agendas e da estrutura do governador do Pará tanto para sua campanha como para de sua mulher e hoje não tem independência para falar em nome dos interesses de Lula.
Gleisi Hoffman, então, teria interrompido Rocha para dizer, em tom de ameaça, que Lula “não ficará sem palanque no Pará”. Ou seja, se Helder Barbalho decidir que fará campanha para Tebet, o PT terá que levantar palanque próprio no Pará. Isso posto, certamente trará para esse palanque o Psol de Edmilson Rodrigues, cuja direção nacional já decidiu que imporá à seção local o lançamento de candidatura ou o apoio ao PT, mesmo tendo Edmilson assumido, em dezembro de 2021, o acordo explícito de não apresentar candidatura própria que atrapalhasse o sonho medebista da reeleição no primeiro turno.
O caminho das pedras
Buscando uma mediação possível, ainda na reunião em São Paulo, Rocha recomendou a Gleisi que Lula procurasse um contato direto com Helder e que pedisse, pessoalmente, ao governador do MDB, que retribuísse a declaração de apoio recebida por ele quando da entrevista que o ex-presidente deu a “O Liberal”. Essa sugestão imporia a Helder uma nova declaração, desfazendo a que fizera em apoio a Tebet, explicitando dessa vez o apoio à candidatura do petista à Presidência da República.
Até agora, Lula já conta com apoio declarado à sua candidatura de integrantes dos diretórios do MDB de Alagoas, Ceará, Paraíba, Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Piauí e Amazonas. Renan Calheiros, senador licenciado e uma das vozes mais ativas do MDB, declarou a UOL que não quer fazer “uma guerra interna” de disputa pela não homologação da candidatura de Tebet, mas o fará “se isso for preciso”. Para ele, a divisão do campo progressista “não ajuda efetivamente em nada”. Renan defende que o MDB declare voto em Lula já no primeiro turno, não gastando tempo e dinheiro com uma candidatura simbólica.
“Nossa necessidade é de manter a maior bancada no Senado, fazer uma grande bancada na Câmara e eleger o maior número de governadores”. As convenções do MDB acontecerão apenas no início de agosto e, segundo o líder medebista de Alagoas, “talvez não seja efetivamente o caso de termos que homologar uma candidatura com 1% dos votos”, referindo-se às pesquisas eleitorais que colocam Tebet nesse patamar.
Algo de novo no front
Olhando de longe, parecia que nada de novo ocorrera depois das declarações de Calheiros e da reunião de Paulo Rocha na Fundação Lula, mas eis que, por coincidência ou não, a coluna de Igor Gadelha, no jornal “Metrópoles”, confirma que o ex-presidente Lula se encontrará nos próximos dias com “um governador filiado ao partido de Simone Tebet”. Trata-se, não por acaso, de Helder Barbalho. A sugestão de Paulo Rocha foi ouvida em São Paulo e a solução, se vier, não terá sido apresentada por Beto, e sim por seu adversário interno que, na eventualidade de um impasse, seria o nome petista a disputar com Helder o executivo estadual. Com as bênçãos de Lula.
Si non è vero, è ben trovato, diria don Vito Corleone, na ficção de Mário Puzzo.