Uma das muitas formas de compra de voto possíveis e incorporadas à dinâmica das eleições é o recrutamento de pessoas para balançar bandeiras nas esquinas, onde candidatos ricos pagam de R$ 100 até R$ 360 semanais, ‘ajudando na renda das famílias’/Fotos: Divulgação.

Por Olavo Dutra|Colaboradores

Pesquisa encomendada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre as Eleições apontou que a compra e venda de votos ainda é uma realidade no Brasil, uma vez que pelo menos 28% dos entrevistados revelou ter conhecimento ou testemunhado essa prática ilegal. A pesquisa foi realizada pela Checon Pesquisa-Borghi e ouviu quase 2 mil eleitores de 18 a 60 anos em sete capitais, incluindo o Distrito Federal.

Uma das conclusões da pesquisa aponta que “a percepção do eleitor no sentido de que a compra de votos é um crime ainda é pequena”. Dessa forma, “muitos enxergam com naturalidade oferecer o voto em troca de benefícios”. A interpretação rigorosa desse dado indica que existe no Brasil uma cultura da compra e da venda do voto.

Talvez isso explique a recorrência do delito. Nesta última semana de campanha, as forças de segurança apreenderam mais de R$ 396 mil em 20 operações distintas para coibir a compra de votos e demais crimes eleitorais País afora. A maior parte na Região Norte, que teve 14 intervenções. 

Cultura da ilegalidade

O fato de haver um indicativo de punição para quem compra votos, mas não estar prevista nenhuma punição para quem o vende é um indutor dessa mercantilização a céu aberto e um estímulo e essa cultura da ilegalidade. “Vocês vêm aqui e não trazem nada pra gente?”, indignou um vendedor a um político veterano que visitava a feira do Guamá, na véspera do derradeiro dia de campanha. 

Das muitas formas de compra de voto possíveis e incorporada à dinâmica das eleições é o recrutamento de pessoas para balançar bandeiras nas esquinas. A conta é demencial. Indagada, Rafaella Dantas de Oliveira, que balançava bandeira para um delegado candidato, admitiu que receberia R$ 100 por dia. “Tem candidato pagando mais, mas eu não consegui vaga na equipe dele”, afirma, apontando para pessoas do outro lado da rua que balançam bandeiras para um ex-secretário de Finanças de prefeitura do interior, convertido em milionário instantâneo e em candidato ostentação na campanha mais cara da história do Pará.

Voto sumiu do mercado

Os milionários nessa eleição são tantos, que o produto-voto escasseou.

A percepção unânime de que as Eleições 2022 são, de longe, as mais caras da história do Pará, ganha contornos bizarros quando se ouve nos bastidores os números da gastança e quando se vê, nas ruas de Belém, uma legião de pobres agitando bandeiras para candidatos desconhecidos, muitos dos quais só visitaram Belém como turistas.

Influências colaterais

O muito dinheiro das ruas influencia também as chamadas pesquisas de ocasião, aquela que converte a opinião em biombo para a exibição de “listas pagas” que escalam os “favoritos” nos pleitos proporcionais com o mesmo método que os supermercados distribuem os produtos em suas gôndolas: os que pagam mais ficam no raio da visão do consumidor.

Bandeiras, “lideranças” com listas de eleitores cativos, pesquisas de ocasião, derrama de santinhos na véspera de eleição, tudo isso se processa a céu aberto, nas barbas da lei. São facetas da mesma entrega, pelos candidatos e partidos, de vantagens ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto. O placar nunca muda quando as regras parecem se alterar, mas jogadores e clubes permanecem os mesmos, comprando o resultado com a ajuda da torcida.