Por Olavo Dutra
Pero Vaz de Caminha tinha razão quando, logo que aqui chegou, em 1500, escreveu ao rei dom Manuel, cunhando a máxima de que no Brasil, “em se plantando, tudo dá”. Séculos depois, com o advento do colunismo socia e da imensurável indústria dos blogues e blogueiros, a expressão ganhou uma extensão inesperada, que reconhece a abundante plantação de notas em veículos digitais de informação, muitas pagas com dinheiro, favores e escambos – espécie de mercado paralelo cujo fulcro é fazer crer e dar, aos agricultores de fofocas, vantagem competitiva em relação aos concorrentes.
Pelo menos essa é a ideia.
‘Vozes” do governador
Quem acompanha as notinhas e blogues paraenses se viu confuso nos últimos dias, já que muitas delas literalmente “nomeavam” secretários de Estado, dividiam ou criaram secretarias e substituíam a voz oficial do governo silente. O mutismo governamental suscitou ou atiçou conflitos intensos nos corredores do palácio, enquanto o governador Helder Barbalho curtia o inverno em Davos, na Suíça, onde se destacou no debate “Caminhos para entregar uma bioeconomia sustentável na Amazônia”, na última quinta, no Fórum Econômico Mundial 2023.
Os três mosqueteiros
Ao sair do Pará, Helder deixou em cena o triunvirato constituído por Chicão Melo, presidente da Assembleia Legislativa, a vice-governadora, Hana Ghassan, e Luiziel Guedes, chefe da Casa Civil, que se incumbiram de ganhar tempo até a volta do poderoso chefe. A baixa interlocução do comitê provisório irritou muitos dos convidados ao café ralo e frio serviço pelo trio maravilha. A maioria dos que foram em busca de respostas saíram com mais dúvidas do que certezas.
Tapa nas especulações
Ao subir na aeronave em direção da Davos, o governador deixou apenas três nomes certos no novo secretariado. Rossieli Soares, ex-ministro de Temer que também ocupou uma secretaria na gestão Dória, em São Paulo, que assumiu a Secretaria de Educação. Elieth Braba, pessoa de confiança de Hana Hassan, que estava na pasta da Educação, foi escalada para a Secretaria de Planejamento e Administração, e Ursula Vidal, antes cotada para um posto no Ministério da Cultura, cujo retorno foi anunciado pelo chefe do Executivo em evento público na véspera do aniversário de Belém, para espanto de parte da plateia.
O anúncio antecipado do retorno da jornalista à sua pasta de origem teve por objetivo dar fim a uma série de especulações sobre o destino da companheira de partido do governador.
Plantação de notas
O restante, até aqui, é apenas e tão somente produto da vasta e inesgotável plantação de notas – e não é nada bacana; muito pelo contrário. Hélio Leite, ex-deputado, assumir a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos, por exemplo, é possível? Sim, mas seria um desafio considerável para um corretor de imóveis, profissão de origem de Leite, além de produzir uma agitação indesejável entre advogados e juristas. Manda a prudência agasalhá-lo em um ponto menos visível do horizonte político e administrativo.
Conflitos e destinos
Alessandra Haber, a deputada mais votada no pleito do ano passado, estaria cotada para ocupar a Secretaria de Saúde, o que, para observadores do próprio governo, representaria uma ‘sopa no mel’ para quem é empresária da área hospitalar. O que sombreia a nomeação imediata não é o conflito previsível de destinos e interesses entre a família Daniel-Haber e o clã Barbalho. O obstáculo vem de longe, mais precisamente de São Paulo, onde Michel Temer, um dos avalistas da indicação de Jader Barbalho Filho para o Ministério das Cidades cobra a volta ao cenário do qual jamais saiu.
Sombras de Brasília
Já tendo indicado o titular da Secretaria de Educação, o ex-presidente Temer almeja colocar as mãos na Saúde – onde já teve um indicado Alberto Beltrame – e reivindica nada mais, nada menos do que a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Mineração e Energia, ocupada atualmente por José Fernando Gomes Júnior. Considerando o orçamento do Ministério das Cidades, a conta saiu barata para Lula.
Dentre os possíveis secretários anunciados na última semana sem a anuência do governador estariam muitos ex-parlamentares, derrotados em 2022, e que estão tornando os corredores da Casa Civil um muro de lamentações permanente.
Vale de lágrimas
Cássio Andrade, que após uma reunião a portas fechadas para assegurar sua presença na Secretaria de Esporte e Lazer deu dois passos para fora do prédio e antes de entrar no carro vazou a informação para um blogue foi repreendido pelo presidente da Assembleia Legislativa, Chicão Melo, responsável por manter a disciplina da tropa.
Doutora Heloisa Guimarães, Nilson Pinto, Paulo Bengtson, Professora Nilse Pinheiro, Cristiano Vale e Flexa Ribeiro compõem uma das alas dos peregrinos.
O vale de lágrimas não para de jorrar.