Ação do Estado em dois dias contabilizou apenas 50 abordagens a pessoas, dez validações ambientais, onze verificações de antecedentes criminais e apreensão de 35 reses e um trator, balanço pífio em uma região onde imperam a exploração ilegal e o contrabando.
Por Olavo Dutra | Colaboradores
O folclore brasileiro incorporou – e encorpou – uma de suas mais famosas lendas, a do curupira, em meados do Século XVI. O mítico protetor das florestas carrega duas características básicas – variáveis dependendo da região -, uma delas estranha para os padrões nacionais: ser um anão de cabelos ruivos – ou seriam vermelhos? – e ter os dois pés para trás. Os indígenas acreditavam que o curupira aterrorizava e matava aqueles que entravam na floresta para caçar ou derrubar árvores, mas brecava suas ações em troca de agrados – um ‘cigarrinho’.
Na manhã do último dia 15, o governo do Estado, despois de emprestar o nome do mítico personagem do folclore nacional, deslanchou, com o devido estardalhaço, portentosa operação contra a prática de malfeitos e exploração ilegal de recursos naturais na região de Carajás, assentando as bases iniciais no município de São Félix do Xingu.
O pacote da “Operação Curupira” chegou através da Secretaria de Meio Ambiente, com lastro nos órgãos do Sistema de Segurança Pública, em nome do fortalecimento da presença do Estado em regiões identificadas como áreas críticas, devendo se estender a outras igualmente críticas.
Dois dias depois do início da operação, o anúncio oficial: cerca de 50 abordagens a pessoas e motocicletas, dez validações ambientais e onze verificações de antecedentes criminais, além da apreensão de 35 reses e um trator, de acordo com “o planejamento estabelecido” e ajustado diariamente, segundo o secretário de Segurança, Ualame Machado.
Silêncio do curupira
Nessa fronteira, institucionalmente, o governo do Pará dava ‘satisfações’ à comunidade internacional, que cobra providências contra o abate da floresta e suas derivações. No português claro, é como se o famoso e lendário curupira de São Félix do Xingu tivesse recebido uma carrada de cigarros do Paraguai, deixando os malfeitores que atuam na região livres de amarras porque, ao final e ao cabo, o balanço inicial da operação é ridículo: nem cabos de vassouras foram apreendidos, muito menos minério, que segue escoando livremente rumo ao Porto de Barcarena.
O peso da máquina
A noção de que o custo benefício da “Operação Curupira”, ao menos até agora, não compensa, se justifica pelo peso da máquina pública instalada na região. O diretor de Fiscalização da Secretaria da Fazenda, Paulo Rodrigues Veras, por exemplo, destacou o auditor Amadeu Fadul para coordenar sua equipe na operação. Fadul é homem de confiança do homem de confiança do governador Helder Barbalho na Secretaria, Paulo Sérgio Melo Gomes, marido da secretária Elieth Braga.
Os chefes dos postos fiscais da Sefa da região do Carajás, em Marabá, e Araguaia, em Conceição do Araguaia, não estão envolvidos nesses assuntos. Amadeu Fadul, porém, que não ocupa função de chefia, informalmente coordena a fiscalização de trânsito, operações volantes e itinerantes, como essa que está acontecendo em São Félix do Xingu.
O que acontece no reino?
Mas, afinal, o que acontece no “Reino de Carajás”? São Félix do Xingu, distante pouco mais de 1 mil quilômetros de Belém, está assentado em uma área muito rica de pouco mais de 84 mil quilômetros quadrados e conta população de 132 mil habitantes. É administrado pelo prefeito Cleber Torres, do MDB, tido como amigo pessoal do governador Helder Barbalho. Torres controla o município política e comercialmente.
Seu poder de fogo é considerado tão grande que, por força de sua influência junto ao governador, teria indicado o ex-secretário de Meio Ambiente do município Bruno Kono ao cargo de presidente do Iterpa. Mais recentemente, a última façanha política do prefeito levou o governador Helder Barbalho a negociar a vaga do primo Igor Normando na Assembleia Legislativa, dando-lhe um cargo no Secretariado, para acomodar o suplente de deputado estadual Torrinho, irmão do prefeito. Cleber Torres, pelo que se vê, não faz barulho, mas acontece.
Nada de novo no front
O que acontece em São Félix do Xingu em termos de devastação florestal e exploração ilegal, que andam atreladas com o problema fundiário, só a “Operação Curupira” poderá dizer, mas, como não se sabe de grandes apreensões de algum carregamento de madeira, de minério, de cerveja e nem de cabos de vassoura há de se supor que nada acontece – conclusão que fonte da Secretaria da Fazenda ouvida pela coluna chama de ‘chacota’, seja lá o que isso significa, no caso.
Em todo caso, com o perdão do curupira.