O prefeito Edmilson Rodrigues comanda pessoalmente as tratativas sobre a criação do Comitê de Turismo Gastronômico, que, se sair do papel, não terá passado por qualquer debate público, embora então tenha rendido notas de jornal/Fotos: Divulgação.

Por Olavo Dutra | Colaboradores

Indigestão à vista: na gestão Edmilson Rodrigues, criação de comitês em série pode ser colecionada por ordem alfabética e tem se prestado à evidente procrastinação de medidas no transporte público, abastecimento de água, reorganização de feiras…

A coluna “Repórter Diário” – jornal “Diário do Pará” – da última segunda-feira 22 anunciou que a Prefeitura de Belém criou um Comitê de Turismo Gastronômico na cidade. Segundo a nota, o grupo “deverá ser (sic) integrado por representantes dos governos municipal e estadual e de instituições ligadas à gastronomia”.

Quais instituições? Que representantes?

Há uma máxima antiga, mas que segue válida, segundo a qual “quando você não quiser resolver um problema, crie um comitê”. A gestão Ed 50 vem seguindo o receituário à risca.

A noção de comitê se originou do idioma francês, embora sua raiz etimológica seja encontrada no inglês committee. O conceito pode ser usado, de modo abusivo, como sinônimo de comissão, mas vai além: é um grupo de indivíduos que trabalham juntos para resolver um problema ou executar um projeto, mas que têm o poder de decisão sobre aquilo. Exemplo: o Comitê Olímpico Internacional é um órgão permanente, responsável pela organização dos Jogos Olímpicos e pela promoção do olimpismo em todo o mundo. Ou seja, é um comitê porque tem o poder de decisão. O mesmo vale para o comitê central de um partido.

omitê Central do Partido Comunista da China, conhecido como o Comitê Executivo Central até 1927, é até hoje a autoridade máxima dentro do Partido Comunista da China e do país. Seus cerca de 350 membros são escolhidos uma vez a cada cinco anos pelo Congresso Nacional do PCC – ops!

Foi sem antes ter sido

Na Prefeitura de Belém, no entanto, a criação de comitês em série – basta ler o “Repórter Diário” para colecioná-los por ordem alfabética – tem se prestado à evidente procrastinação. Há comitês para debater o transporte público, o abastecimento de água, a reorganização das feiras, etc, etc…

O Comitê de Turismo Gastronômico parece ser mais um fadado ao esquecimento e que foi inventado para gerar notas na imprensa e dar a impressão de que algo está sendo feito em prol da solução de uma temática específica. A frase “integrado por representantes dos governos municipal e estadual” intriga mais do que anima.

Explica-se: o secretário de Turismo do Estado é Eduardo Costa, ex-deputado, que se notabilizou, entre outras coisas, por ter arremessado um copo d’água no desafeto, o prefeito Chico Neto, em comício eleitoral em Capanema, na presença do governador do Estado. Destemido, Costa disse, com todas as letras, em evento de apresentação dos secretários, que teve que ler no caminho as funções e obrigações da Secretaria, por ter sido “surpreendido com a nomeação” ao cargo.

Ferramenta de marketing

Pode-se fazer uma lista de critérios segundo o qual o leitor poderia, por conta própria, distinguir comitês reais de comitês fictícios, criados como pura marquetagem. A primeira característica é que comitês reais têm CPF, nome e sobrenome, ou seja, tem um coordenador tornado público e anunciado, de quem a sociedade poderá cobrar a rotina das tarefas e os resultados. Quando um órgão público anuncia um comitê e omite seu coordenador ou coordenadora, o comitê não existe. E jamais será encontrado para se saber se funcionou e o que, de fato, fez.

Segundo, um comitê real é construído com base em estudo prévio, que, se existe, deve ser socializado, para que a cidade viva possa se manifestar acerca dos dados, do escopo e dos prazos ali alinhados.

O turismo culinário ou gastronômico, objeto do mais recente comitê, é um conceito que parte da premissa de que a gastronomia de um destino turístico – país, cidade ou região – é um ativo econômico, sempre presente na cultura local e por isso é incontornável na experiência de um turista, já que almoçar ou jantar fora é uma necessidade para qualquer viajante. Gastronomia, portanto, antes de ser turismo, é cultura e é economia. Ou melhor, para ser turismo é, antes de tudo, cultura e economia.

Panela que muito se mexe

Nesse caso, a Fumbel deveria ser a base de um comitê que discute a temática e sua coordenação deveria estar nas mãos da titular da pasta, Inês Silveira, ex-assessora de gabinete do prefeito Edmilson Rodrigues e o terceiro nome a ocupar o cargo nessa terceira passagem do ex-deputado pelo Executivo municipal. Dito de outro modo, a coordenação do dito comitê deveria estar no órgão que faz a gestão cultural da cidade e que, em tese, detém uma visão transversal do governo e da vida social de Belém, cujo fulcro será sempre cultural.

A União Europeia, por exemplo, fez eco à necessidade de integrar a cultura em todas as áreas do desenvolvimento, agregando a inteligência do setor à totalidade dos debates relativos ao desenvolvimento econômico e social de seus países.

A culpa é do passado

Infelizmente, a Prefeitura de Belém tem lido as críticas que a imprensa publica não como incentivo à melhoria de sua performance, mas deveria. Nenhum cidadão, em sã consciência, deseja o pior para o lugar onde vive. Parar de montar comitês, deixar para lá a desculpa de que tudo é culpa da herança maldita das gestões anteriores e de Bolsonaro e colocar as secretarias para executar aquilo que suas normativas constitutivas preveem já seria um bom começo.